Magistrados prosseguem julgamento de Eduardo Cunha hoje |
O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta
quarta-feira por transformar o atual presidente da Câmara dos Deputados,
Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em réu na Operação Lava Jato pelos crimes de corrupção
passiva e lavagem de dinheiro.
Os magistrados não atenderam a todos os pedidos do
Ministério Público e circunscreveram as suspeitas apenas a fatos ocorridos a
partir de 2009.
Logo, a denúncia foi aceita com base nas acusações de
recebimento de 5 milhões de dólares de propina por Cunha - e não 40 milhões de
dólares, como pedia o Ministério Público.
Segundo o que o MP chamou de "propinolândia",
entre junho de 2006 e outubro de 2012, Cunha pediu e aceitou propina de cerca
de 15 milhões de dólares do lobista Julio Camargo por causa da contratação do
navio-sonda Petrobras 10000 com o estaleiro Samsung heavy Industries.
Também estavam envolvidos na transação, entre outros, o
operador Fernando Baiano e o ex-diretor de área internacional da Petrobras
Nestor Cerveró, que, como dirigente da petroleira, corroborou a transação
fraudulenta.
Entre fevereiro de 2007 e outubro de 2012, o MP elencou
novas evidências de que o peemedebista, segundo na linha sucessória da
presidente Dilma Rousseff, teria embolsado dinheiro sujo.
Para o ministro relator, Teori Zavascki, no entanto, não há
indícios suficientes da participação de Eduardo Cunha em todos os episódios.
Isso porque o lobista
Fernando Baiano disse, em delação premiada, que conheceu o deputado apenas em
2009, o que fragiliza, portanto, a tese da acusação de que o peemedebista tenha
recebido propinas desde 2006, época de celebração dos contratos envolvendo
navios-sonda.
Zavascki pontuou que existem "elementos mais do que
suficientes" de repasse de dinheiro sujo ao ex-diretor Nestor Cerveró no
afretamento dos navios Petrobras 10000 e Vitoria 10000, mas afirmou que, pelo
menos nos anos de 2006 e 2007, quando foram celebrados os contratos de
navios-sonda com a Samsung Heavy Industries, não há indício de participação do
atual presidente da Câmara dos Deputados.
"Há indícios robustos para receber parcialmente a
denúncia, cuja narrativa, ademais de reforçado pelo aditamento, dá conta de que
Eduardo Cunha procurou por Fernando Soares, aderiu ao recebimento de vantagem
indevida oriunda de propina destinada a diretor da Petrobras", disse o
relator.
"Os elementos colhidos comportam sobejamente o possível cometimento
de crime de corrupção passiva majorado, com aumento na qualidade de partícipe
por parte do deputado Eduardo Cunha, ao incorporar-se na engrenagem espúria do
ex-diretor Nestor Cerveró", completou ele.
"Quanto à participação na celebração dos contratos,
houve uma certa alusão inicial por parte de depoimentos de delação, mas nada
disso foi confirmado. Os próprios colaboradores se encarregaram de afastar essa
hipótese. O que restou e não deixa de ser grave é a participação nesse segundo
momento", disse Zavascki.
Os ministros Cármen Lúcia, Marco Aurélio, Edson
Fachin, Luis Roberto Barroso e Rosa Weber seguiram o voto do relator contra
Eduardo Cunha, formando maioria em desfavor do congressista. O julgamento será
retomado amanhã.
De acordo com relato do MP, no entanto, o deputado aceitou
propina de mais 25 milhões de dólares para o afretamento de outro navio-sonda,
o Vitoria 10000, contratado também em junto à Samsung Heavy Industries.
"Nos dois navios-sonda, Eduardo Cunha era o sócio-oculto de Fernando Soares
e também foi o destinatário final da propina paga, tendo efetivamente recebido
ao menos cinco milhões de dólares", disse o procurador-geral da República,
Rodrigo Janot.
Os contratos dos navios-sonda Petrobras 10000 e Vitoria 10000
custaram, respectivamente, 586 milhões de dólares e 616 milhões de dólares.
"Houve irregularidades na contratação ilícita desses dois navios-sonda no
âmbito da Diretoria Internacional. O valor dos contratos supera 1 bilhão de
dólares, o que supera e muito o orçamento anual do Ministério Público da
União", afirmou Janot.
Na primeira leva da propina, diz a acusação, o pagamento a
Eduardo Cunha foi para garantir a manutenção do esquema de corrupção. Em um
segundo momento, o recebimento de 5 milhões de dólares foi para pressionar o
retorno do pagamento de propinas ao peemedebista.
Na transação para que o propinoduto de Eduardo Cunha
estivesse sempre abastecido, a correligionária do peemedebista, Solange Almeida
(PMDB-RJ), atual prefeita de Rio Bonito (RJ), passou a apresentar, na Câmara
dos Deputados, requerimentos com pedidos de informação sobre os dois contratos
da Samsung Heavy Industries, perante a Comissão de Fiscalização Financeira e
Controle da Câmara, como forma de pressionar o lobista Julio Camargo.
Nos documentos
datados de 2011, por exemplo, Solange Almeida, aliada de Cunha, solicitou ao
Tribunal de Contas da União (TCU) e ao então ministro de Minas e Energia,
Edison Lobão (PMDB-MA) dados de contratos, auditorias, aditivos e licitações
que envolviam "o Grupo Mitsui com a Petrobras ou qualquer das suas
subsidiárias no Brasil ou no exterior".
Os requerimentos
comprovam, na avaliação do Ministério Público, que aliados de Cunha fizeram
pressão política sobre a Mitsui e o lobista Julio Camargo depois de supostos
atrasos no pagamento de propina. Camargo era representante do Grupo Mitsui.
Em outubro do ano passado, o procurador-geral fez uma
complementação da denúncia e acrescentou trechos do depoimento em que o lobista
Fernando Baiano, que se tornou delator da Operação Lava Jato, confirma que
Eduardo Cunha recebeu pelo menos 5 milhões de dólares nos dois contratos de
navios-sonda.
Defesa - Ex-procurador-geral da República, o advogado
Antonio Fernando de Souza questionou supostas omissões do Ministério Público ao
descrever a atuação de Cunha.
Ele disse, por exemplo, que o lobista Fernando
Baiano só conheceu o deputado em 2009 e, portanto, não poderia ter atuado em
favor do parlamentar desde 2006, quando o primeiro episódio de propina ocorreu.
Souza ainda tentou desqualificar a influência de Eduardo Cunha sobre o
ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró e disse que os delatores da Lava Jato
Julio Camargo e Fernando Baiano "inventaram" acusações contra o
peemedebista.
"Não ajustou nada com ninguém. O ajuste está dito entre
Cerveró, Fernando e Julio", sustentou.
Auditoria encaminhada ao Ministério Público em maio do ano
passado aponta uma série de irregularidades cometidas na compra de navios-sonda
pela Petrobras e indica que o então diretor da Área Internacional Nestor
Cerveró atuou diretamente para fechar os dois contratos dos navios-sonda,
considerados desnecessários à empresa e que, ao final, tiveram preços
superestimados sem explicação.
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